top of page

Diferenciação de gêmeos idênticos através da epigenética forense

​

​

​​ Em 08.07.2020

       Desde que o estudo da epigenética começou a se mostrar promissor para a comunidade científica, verificou-se que esta ciência também poderia ser útil para a diferenciação de gêmeos monozigóticos (= univitelinos ou idênticos – Figura 01), entre outras finalidades. Embora as análises convencionais usadas na genética forense não consigam diferenciar os gêmeos univitelinos, uma vez que estes possuem seqüências originais idênticas de DNA, modificações acumuladas ao longo da vida em cada um dos gêmeos deixam marcas genéticas distintas e que podem ser identificadas em cada um dos genomas.

Figura 01. Gêmeos monozigóticos (conhecido também como univitelinos ou idênticos) (Fonte: Acervo Wix).

       Alguns artigos indicados nas bibliografias sugeridas abaixo (Fraga et al., 2005; Kaminsky et al., 2009; Krawczak et al., 2012; Li et al., 2013; Weber-Lehmann et al., 2014) estudaram técnicas pelas quais é possível realizar a diferenciação genética entre gêmeos monozigóticos. Tais estudos foram citados brevemente por mim no capítulo 10 do livro intitulado “Introduccion a la Antropología Biológica” (2016), traduzido para o português em 2017 (clique aqui para realizar o download gratuito deste livro).

gêmeos felizes

       Um experimento realizado ainda em 2005 (Fraga et al., 2005) mostrou em detalhes algumas diferenças na expressão dos genes no decorrer da vida em 80 (oitenta) voluntários gêmeos monozigóticos (= 40 pares). Foram os autores deste importante estudo que demonstraram com várias técnicas que, na medida em que ficamos mais velhos, há um acúmulo de modificações epigenéticas no organismo, e essas modificações podem ser identificadas para diferenciar geneticamente gêmeos idênticos. Exposição a químicos (álcool, cigarro, poluição, etc.), hábitos de dieta e outros fatores ambientais são os principais fatores relacionados com a mudança na expressão dos nossos genes ao longo da vida.

       Embora não seja o escopo desta coluna detalhar minuciosamente os aspectos técnicos relacionados à diferenciação genética entre gêmeos monozigóticos, importa mencionar aqui que muitas das técnicas epigenéticas de análise inclui o estudo da metilação no DNA. Em linhas gerais, metilação é um processo natural que ocorre nas nossas células a fim de reprimir a expressão gênica. Em tal processo ocorre o acréscimo de grupo metil (CH3) em pontos específicos do genoma, predominantemente nas chamadas ‘Ilhas CpG’ (= grupos de pares de bases nitrogenadas contendo Citosina-fosfato-Guanina – reconhecidos como ‘pontos quentes’ de metilação no genoma). Um dos segredos por trás da análise laboratorial das regiões metiladas num determinado genoma é o conhecimento de que uma citosina, quando ela é desaminada (= remoção um grupo amino – NH2), se transforma em uma uracila. A citosina metilada e desaminada, por sua vez, transforma-se numa timina. O DNA extraído das células e tratado com compostos químicos e/ou biológicos (enzimas de restrição, bissulfito, entre outras substâncias) pode evidenciar diferentes sítios de metilação entre duas amostras quaisquer ou converter uma citosina não-metilada em uracilas (citosinas metiladas são resistentes a esta conversão). Posteriormente, análises adicionais podem identificar exatamente quais regiões apresentavam-se metiladas ou não nos genomas investigados e se tais genomas são relacionados a um mesmo indivíduo ou a pessoas distintas. Toda essa análise complexa é decorrente dos adventos tecnológicos e métodos refinados de análises laboratoriais disponíveis na comunidade científica na atualidade.

       Explorar essas diferenças entre gêmeos monozigóticos através dos conhecimentos acima e também com outras metodologias pode permitir a elucidação de casos criminais mais complexos em que um determinado suspeito possui um irmão gêmeo ou, alternativamente, pode fazer com que um exame de paternidade seja resolvido de maneira definitiva. Quem quiser se aprofundar ainda mais sobre este tema é importante saber que as análises adicionais mencionadas acima podem envolver também a tecnologia conhecida como ‘análise de curva de dissociação de alta resolução’ (HRMA - High-Resolution Melting Curve Analysis) ou pelo Sequenciamento de Nova Geração (NGS - Next Generation Sequencing) acoplado com a técnica da Imunoprecipitação do DNA metilado (MeDIP - Methylated DNA ImmunoPrecipitation). Uma interessante revisão [em português] publicada no Brazilian Journal of Forensic Sciences, Medical Law and Bioethics compilou alguns trabalhos que estudaram a diferenciação genética de gêmeos monozigóticos (Antônio, 2017) e explica em linguagem acessível algumas destas técnicas utilizadas na prática forense. Desta forma, protocolos genéticos para realizar tal façanha já é de conhecimento da comunidade científica nacional e internacional há alguns anos.

       Além dos métodos epigenéticos, que parecem ser dos mais promissores para realizar a diferenciação genética entre gêmeos univitelinos (Li et al., 2013), mutações de um único ponto no próprio genoma, denominada SNPs (Single Nucleotide Polymorphisms) também já foram estudadas para esta finalidade (ver Weber-Lehmann et al., 2014 para maiores detalhes). A análise com SNPs envolve simples discriminação alélica, podendo ser feito com o Sequenciamento de Sanger ou pelo Sequenciamento de Nova Geração. Tais procedimentos técnicos também estão descritos no artigo mencionado anteriormente da Antônio (2017).

Tem dúvidas sobre o assunto? Não perca tempo, faça perguntas, sugestões ou até mesmo críticas ao autor desta coluna através do email splicinginminds@gmail.com

- Referências Sugeridas -

​

​

Antonio LU, Pereira MMI, Ferraz JAML. Diferenciação genética de gêmeos monozigóticos: uma importante evidência para área forense. Brazilian Journal of Forensic Sciences, Medical Law and Bioethics, 6(4): 485-499. 2017.

 

Fraga MF, Ballestar E, Paz MF, et al. Epigenetic diferences arise during the lifetime of monozygotic twins. Proc Natl Acad Sci. USA. 102: 10604-10609. 2005.

 

Kaminsky ZA, Tang T, Wang SC, et al. DNA methylation profiles in monozygotic and dizygotic twins. Nat. Genet. 41: 240–245. 2009.

​

Krawczak M, Cooper DN, Fändrich F, et al. How to distinguish genetically between an alleged father and his monozygotic twin: a thought experiment. Forensic Sci Int Genet. 6: 129-130. 2012.

​

Li C, Zhao S, Zhang N, et al. Diferences of DNA methylation profles between monozygotic twins' blood samples. Mol Biol Rep. 40: 5275-5280. 2013.

​

Weber-Lehmann J, Schilling E, Gradl G, et al. Finding the needle in the haystack: Differentiating ‘‘identical’’ twins in paternity testing and forensics by ultra-deep next generation sequencing. Forensic Sci. Int. Genet. 9: 42–46. 2014.

Dr. Caio Cesar Silva de Cerqueira

Biólogo – Geneticista – Perito Criminal

Criador do Site www.operito.com.br

bottom of page